A Polícia Federal prendeu, na noite desta terça-feira (30), a cuidadora de idosos Cláudia Mônica Pinheiro Torres de Freitas. A mulher é suspeita de se passar por enfermeira e comercializar ilegalmente vacinas contra a Covid-19. De acordo com a polícia, Cláudia Mônica é a profissional responsável pela vacinação dos empresários do setor de transportes, em uma garagem de ônibus de Belo Horizonte.
Ainda segundo a Polícia, a falsa enfermeira foi encaminhada para o Complexo Penitenciário Estevão Pinto, na capital.
O advogado de defesa de Cláudia, Bruno Agostini Ribeiro, disse que ela cumpriu as determinações da PF e só se manifestará após analisar o processo.
A cuidadora de idosos responderá pelos crimes de falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Os crimes preveem prisão por até 15 anos e multa.
Investigações
A Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão na casa da cuidadora de idosos na tarde desta terça-feira, no bairro Itapoã, na Região da Pampulha, em Belo Horizonte. A mulher e o filho dela, Igor Torres de Freitas, foram levados à delegacia para prestar depoimento. O motorista da família, responsável pelo transporte dos dois e das doses da vacina também foi ouvido. Igor e o funcionário foram liberados.
Durante os trabalhos na casa dos suspeitos, os policiais encontraram doses de vacinas contra a gripe e ampolas de cloreto de sódio. É possível que esses materiais tenham sido utilizados na vacinação das 57 pessoas que passaram pela garagem da empresa Coordenadas, de maneira clandestina. Nenhum imunizante contra a Covid-19 foi encontrado, segundo a PF.
Entenda o caso
A informação sobre a vacinação dos empresários foi publicada na edição on-line da revista Piauí. De acordo com a reportagem, um grupo de políticos e empresários, a maioria ligada ao setor de transporte de Minas Gerais, e seus familiares, teriam tomado a primeira das duas doses da vacina contra Covid.
A reportagem diz que eles teriam comprado o imunizante por iniciativa própria – cometendo duas irregularidades: fazendo a aquisição e vacinação antes que os 77 milhões de brasileiros dos grupos prioritários tenham sido vacinados, e sem a doação de metade das vacinas adquiridas ao SUS, como prevê a lei.
Ainda segundo a reportagem, cada vacina custou R$ 600 e a segunda dose está prevista para ser aplicada nas cerca de 50 pessoas daqui a 30 dias. A revista afirma ainda que a vacina aplicada seria da Pfizer. A Pfizer negou a venda de vacinas fora do Programa Nacional de Imunização (PNI).
Entre os vacinados, segundo a Piauí, estaria o ex-senador e ex-presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Clésio Andrade. Ao G1, ele disse que desconhece o assunto e que está em quarentena, no Sul de Minas, há dois meses.
À revista Piauí, Andrade afirmou: “Estou com 69 anos, minha vacinação [pelo SUS] seria na semana que vem, eu nem precisava, mas tomei. Fui convidado, foi gratuito para mim”. Questionado pela TV Globo, o ex-senador não confirmou a declaração.
E, de acordo com a Piauí, os organizadores da vacinação foram os donos da viação Saritur. Um deles, Rubens Lessa, é presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros Metropolitano. Por mensagem ao G1, ele se limitou a dizer: “Tenho conhecimento deste assunto”.
Segundo a publicação, outro vacinado seria o deputado estadual Alencar da Silveira Júnior (PDT). Ele negou que tenha participado.
“Minha amiga me chamou perguntando se estava tendo vacinação noturna, drive-thru, e eu falei com ela que não, que não tem vacinação à noite, que o posto só funciona até 19h e a vacinação é até as 15h30. Ela falou, ‘Não, então tem alguma coisa errada, vem cá para você ver’, disse uma mulher, que preferiu não se identificar.
A TV Globo confirmou que houve uma movimentação anormal em uma das garagens de ônibus da Viação Saritur na última terça-feira. Um movimento que chamou a atenção dos vizinhos.
Um vídeo mostra a fila de veículos no estacionamento. Em uma das vagas, uma pessoa com jaleco branco retira algo do porta malas. Ela dá a volta e para em frente ao motorista e faz um movimento parecido com o que seria a aplicação de uma vacina.
O local que aparece nos vídeos é a garagem da Viação Coordenadas, na Região Noroeste de Belo Horizonte, e teria sido improvisado como posto de vacinação.
Um boletim de ocorrência foi registrado no dia da suposta vacinação. De acordo com o documento, os seguranças disseram aos policiais que houve uma pequena reunião dos diretores da empresa, mas que todos já haviam deixado o local quando os policiais chegaram. Na saída, os policiais foram abordados por um morador que confirmou ter visto no pátio da empresa aproximadamente 25 veículos com seus condutores e passageiros, sendo vacinados por uma mulher de jaleco branco. E que crianças também foram vacinadas. Os policiais entraram na empresa, mas nada foi constatado pelas equipes.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), caso a vacinação seja confirmada, os envolvidos poderão responder pelo crime de contrabando, descaminho e de uso e importação de medicamento farmacêutico sem registro.
O imunizante Comirnaty ainda não está disponível em território brasileiro. A Pfizer e a BionTech fecharam um acordo com o Ministério da Saúde contemplando o fornecimento de 100 milhões de doses da vacina contra a Covid-19 ao longo de 2021.
Fiscalização
A Guarda Municipal de Belo Horizonte disse em nota que foi acionada na terça-feira, mas ao chegar na garagem onde estaria acontecendo a imunização, a Polícia Militar já havia chegado no local.
Os militares relataram que estavam apurando a mesma denúncia, recebida via 190. Os guardas e policiais entraram na garagem e não havia mais nenhuma movimentação. Por isso a PM registrou a ocorrência e ficou responsável por conduzir o caso”, disse.
A Polícia Militar disse que “procedeu ao registro do evento de defesa social, REDS, e direcionou à polícia judiciária para providências subsequentes”.
A Polícia Civil informou que “está verificando a eventual existência de crime, cuja investigação possa ser de sua competência legal”.
O empresário Rubens Lessa, em nota, afirmou que o “endereço da empresa mencionado na reportagem não pertence ao Grupo Empresarial SARITUR, esclarece que os nomes citados na reportagem não fazem parte da direção do Grupo e que, o assunto tratado na matéria, era de total desconhecimento da diretoria da empresa”.
Leia a matéria original em G1