Pelo menos 30 outdoors, espalhados em diferentes pontos da cidade de Feira de Santana, contém a falsa informação de uma cura da Covid-19. A publicidade é assinada pela associação Médicos Pela Vida (MPV), de profissionais defensores do tratamento precoce contra a doença.
Na peça, consta a seguinte informação: “Covid tem cura. Aos primeiros sintomas, não espere! Procure o seu médico e peça tratamento precoce”. Incentivado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o suposto tratamento não teve eficácia comprovada por nenhum órgão internacional respeitado.
Em contato com o Portal A Tarde, a Secretaria da Saúde do Estado (Sesab) reitera que até o momento não há tratamento preventivo da Covid-19. “No dia 30 de março foi emitida uma Nota Técnica recomendando a não prescrição dos medicamentos cloroquina, hidroxicloroquina, nitazoxanida e ivermectina para pacientes com quadro confirmado de Covid-19, internados em unidades estaduais, ou contratualizadas pela Sesab, sem outro diagnóstico que justifique seu uso’, diz a nota.
Procurada, a Prefeitura de Feira de Santana informou que não tem qualquer relação com a peça publicitária.
O infectologista Matheus Todt observou que, além de não trazerem benefícios, o uso do tratamento precoce expõe os pacientes a graves efeitos colaterais. “Além de não serem eficazes no tratamento da COVID-19, atribui-se o aumento de mortes de origem cardiogênica em 2020, em parte, ao uso inadequado da Hidroxicloroquina. Além disso, foram notificados em São Paulo casos de hepatopatia grave relacionados uso inadequado da Ivermectina”, destaca.
“O uso de medicamentos como o antimalárico Hidroxicloroquina e o antiparasitário Ivermectina, são comprovadamente ineficazes tanto no tratamento quanto na profilaxia da Covid-19. Essa é a opinião das principais instituições que atuam no controle da pandemia, como a OMS, a OPAS, o CDC dos EUA, o NHS da Inglaterra, entre outras instituições de renome internacional”, afirma o infectologista.
Mesmo não comprovada cientificamente, a associação Médicos Pela Vida fez um manifesto no site no programa, a favor da intervenção precoce no tratamento da COVID-19, no dia 16 de fevereiro de 2021. Até esta quinta-feira, 22, o documento possui assinatura de 4.715 médicos.
Segundo o documento, a associação segue ‘evidências disponíveis na ciência, pelo Código de Ética Médica, pelos princípios da Bioética e pelo posicionamento do Conselho Federal de Medicina’.
Em nenhum momento o manifesto cita a comprovação científica do tratamento. “Para tal, nos pautamos: em estudos científicos atualizados, na informação clara ao paciente e no seu consentimento livre e informado para uso off-label de medicamentos com os quais temos experiência de longa data, além de conhecimento sobre os mecanismos de ação, farmacocinética, farmacodinâmica, interações medicamentosas e segurança”, diz o manifesto.
O médico cirurgião geral e coordenador da Associação, Eduardo Leite, defende o uso do tratamento precoce e afirmou que a eficácia dos medicamentos não existe para a Associação Brasileira de Infectologia e sim para os infectologistas. “Cito como um exemplo o dos mais renomados infectologistas da Bahia, Dr. Roberto Badaró, que prescreve tratamento precoce para seus pacientes. Milhares de médicos prescrevem, assim como eu. Médicos principalmente africanos e asiáticos, em especial os indianos, que estão tendo sucesso muito grande com o tratamento precoce a base de Ivermectina e Hidroxicloroquina”, declarou.
Leite afirma que existe uma guerra de interesses em desconsiderar ‘drogas de baixíssimo custo que estão tendo muito mais sucesso’. “O tratamento precoce funciona muito bem desde quando ministrado na sua fase inicial e da forma correta, além do acompanhamento médico no dia a dia”, declarou.
OMS
A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o FDA, agência norte-americana que regula medicamentos, desestimulam o “tratamento precoce” e até Bolsonaro ameaça recuar sobre o tema. A campanha publicitária teria sido autorizada pelo médico cirurgião Eduardo Leite, candidato a vereador de Feira de Santana em 2020, pelo Patriota (mas que desistiu da campanha), e um dos coordenadores dos Médicos Pela Vida. O médico negou ter sido o responsável pelo outdoor com a falsa promessa. Ele disse que a publicidade foi bancada por um grupo de empresários em Feira de Santana que pretende “encher o Brasil de outdoor”.
Em novembro do ano passado, um estudo britânico atestou que o uso de hidroxicloroquina e azitromicina (dois dos remédios recomendados em 2020 pelo Ministério da Saúde) não teve benefício em nenhum dos 4,5 mil pacientes, o mesmo relatado em outro estudo com 500 pacientes brasileiros internados em estágio moderado da doença.
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