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Bahia: com menos agências, cresce em 40% o número de correspondentes bancários

Seja pela aposta na tecnologia, pelos bancos enxugando a folha de pagamento ou pela violência de assaltos, o número de agências bancárias vem diminuindo na Bahia. Ao mesmo tempo, vem subindo a quantidade de correspondentes bancários para suprir a demanda. Considerando os últimos cinco anos, o crescimento desses estabelecimentos foi de 40%. Segundo dados do Banco Central, são 873 agências no estado, contra 21.946 correspondentes bancários, ou 22.282 – se contarmos as casas lotéricas. Enquanto isso, em 2021, dos 417 municípios, 183 não têm nenhuma agência, o que representa 43,9%. 

Sabe a lotérica na esquina de casa? Aquele comércio que recebe boletos no seu bairro e aquela unidade dos Correios onde era possível abrir uma conta? Ou ainda aquela construtora que, além de vender imóveis, também oferece acesso a crédito? Esses estabelecimentos são os chamados correspondentes bancários, que funcionam como pessoas jurídicas contratadas por instituições financeiras para oferecer alguns dos seus serviços aos cidadãos, com intermédio do Banco Central. 

A quantidade desses estabelecimentos é 12% maior que no mesmo período do ano passado, quando o estado acumulou 19.842 correspondentes, sendo 19.493 sem contar as da Caixa Econômica. Quando o período considerado aumenta, a porcentagem acompanha. Em setembro de 2016, eram 15.998 correspondentes – ou 15.646, sem as lotéricas, 40% a menos do que o total em operação em 2021. A empresa Prosegur, por exemplo, saltou de 650 substabelecidos que atuavam como correspondentes em 2020 para 800 em 2021. 

Para quem mora na capital, fica difícil imaginar um cenário em que não existe um banco em cada esquina. A funcionária pública Susana Santana, 55 anos, enfrenta a realidade de morar numa cidade sem nenhuma agência bancária. O município de Antas, a 320 quilômetros de Salvador, já chegou a contar com três agências e perdeu a última, do Banco do Brasil, há cerca de quatro anos.

“A agência passou por uns cinco roubos, aí fechou e dizia que ia reabrir, mas até agora nada. Hoje, funciona como posto, não tem dinheiro, você só faz transferência, não pode fazer depósito e nem saque”, conta a moradora.

Antas está entre os 183 municípios baianos sem agências bancárias. Os dados informados pelo Banco Central através do Sindicato dos Bancários da Bahia mostram que há uma tendência de desaparecimento desse tipo de estabelecimento. Em 2019, eram 164 municípios sem agências (39,3% do total do estado). Já em 2020, o número subiu para 173, com aumento de mais 10 cidades em 2021. Nos últimos cinco anos, 35 municípios baianos entraram para a lista dos que não têm agência bancária. (Confira aqui a lista de agências e postos de atendimento do país por município)

Dos cerca de 19 mil habitantes de Antas, quem precisa movimentar dinheiro tem que ir até Jeremoabo ou Cícero Dantas, que são cidades vizinhas. Existe um mercadinho no município que funciona como correspondente, mas não supre as necessidades dos moradores. “O dinheiro que entra no mercadinho é pouco, então para sacar depende do dia. E se for um salário ou uma aposentadoria, que tem valor mais alto, só em outra cidade mesmo. Aí eu pago no cartão, faço Pix, mexo pelo celular, mas não é todo mundo que pode e quem sofre mesmo são os comerciantes”, explica Susana. 

A proprietária do mercadinho que funciona como correspondente, Evaneide Santos, 46, diz que a parceria com o Banco do Brasil é vantajosa tanto para ela quanto para os moradores da cidade.

“É uma assistência para a população e é bom para mim porque eu mesma uso para sacar dinheiro para mim e os clientes vêm tirar dinheiro e já fazem as compras na minha loja. Tem sido bem atrativo para o comércio, meu ponto foi um dos primeiros e agora já tem uns oito na cidade”, ressalta.

Evaneide admite, contudo, que o limite de saque é de R$1,5 mil e que nem sempre o valor está disponível. “A gente não tem tanta venda assim e tem outro fator também: eu não gosto de ficar com muito dinheiro aqui porque acho perigoso. Depois que o mercadinho virou correspondente, já fomos assaltados duas vezes”, conta ela. 

Impacto na economia
Em Caem, município que fica a 345 quilômetros de Salvador, as reclamações são parecidas. Segundo o prefeito, Arnaldo de Oliveira Filho, mais conhecido como Arnaldinho, a cidade perdeu sua única agência bancária em maio deste ano. A unidade também era do Banco do Brasil e tinha sido instalada há mais de 30 anos.

“Segundo o banco, foi uma política de aumento do uso da tecnologia. Mas, como é que você prioriza a tecnologia em um município pequeno e agrícola, com mais de 3 mil aposentados? Os moradores reclamam bastante. Temos um correspondente bancário aqui, mas com atendimento precário e limite de saque. As pessoas praticamente não usam, vão até Jacobina ou Saúde. A Lotérica é que dá um suporte maior, mas mesmo assim existem coisas que só no banco mesmo”, coloca o gestor. 

Antiga agência do Banco do Brasil no município de Caem (Foto: Leitor CORREIO)A cidade de Caem perdeu sua única agência bancária em maio deste ano (Foto: Leitor CORREIO)Antiga agência do Banco do Brasil no município de Caem (Foto: Leitor CORREIO)A cidade de Caem perdeu sua única agência bancária em maio deste ano (Foto: Leitor CORREIO)

“O banco movimentava a economia local, o impacto foi grande com o fechamento. O comércio sentiu bastante porque aqui tem um dia de feira, que é bastante movimentado. Quando tinha banco vinha gente da zona rural fazer empréstimos e sacar aposentadoria, salário. Isso movimentava ainda mais a feira. Hoje, o pessoal vai para outras cidades”, completa o prefeito.

O presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB), Zé Cocá, destaca que a instalação de um banco facilita ainda a atração de empreendimentos, a abertura de empresas locais, assim como o acesso a programas do governo federal.

“Quando a agência fecha, ocorre um efeito em cascata no comércio local, que fica enfraquecido sem ter o dinheiro circulando. Quem vai sacar a aposentadoria, bolsa família e salário em outra cidade, faz suas compras por lá mesmo e o município pequeno acaba tendo o comércio enfraquecido. Com isso, é menos emprego e menos renda gerada”, diz. 

Para o presidente do Sindicato dos Bancários na Bahia, Augusto Vasconcelos, o crescimento do número de correspondentes é preocupante. “A ideia do correspondente representa uma precarização da mão de obra porque os trabalhadores que atuam nessas empresas não têm os direitos trabalhistas respeitados, assim como não respeitam a convenção coletiva dos bancários. As empresas também não fornecem segurança adequada, aumentando os riscos de eventuais fraudes. O ideal seria a abertura de novas agências bancárias e a ampliação do acesso ao atendimento à população”, opina. 

O CORREIO tentou contato com a Federação Brasileira dos Correspondentes Bancários (Febracon), mas não obteve retorno até o fechamento da reportagem. 

Cadê a agência que estava aqui?
Ainda de acordo com o Sindicato dos Bancários, a Bahia já acumula um saldo de 53 agências a menos só em 2021, até o mês de agosto. Ao longo de todo o ano de 2020, foram menos 55 agências e, em 2019, 49. Das 53 unidades perdidas em 2021, 30 pertencem ao Banco do Brasil. A instituição anunciou no início deste ano que iria passar por um “plano de reestruturação”, com fechamento de agências. Vale destacar que esse fenômeno não está presente somente na Bahia. O Brasil tinha, em 2018, 20.889 agências. Em 2021, são 17.831. 
 
Uma das explicações pode estar no avanço da tecnologia. Segundo uma pesquisa feita pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), em 2020, 67% das transações bancárias eram feitas por meios digitais, que são responsáveis por 8 em cada 10 pagamentos de contas, e por 9 em cada 10 contratações de crédito. Entre os 21 bancos que participaram do levantamento, 8 responderam que foram abertas 7,6 milhões de contas pelos canais digitais, uma alta de 90% frente a 2019. A pesquisa revelou que as transações com movimentação financeira feitas pelo celular registraram um salto de 64% em 2020.

Para o presidente do Sindicato dos Bancários, Augusto Vasconcelos, a tecnologia é bem vinda, mas desde que bem usada.

“Basta a gente passar na frente das agências bancárias para ver que ainda tem uma parcela muito grande da população, principalmente de idosos e pessoas da zona rural, que ainda dependem do atendimento presencial. Sem contar que esse tipo de atendimento tem alçadas maiores, determinados tipos de serviços dependem do presencial e não são feitos pelo aplicativo. E é necessário oferecer condições adequadas para essa parcela da população”, acrescenta Vasconcelos.

O presidente do sindicato expõe ainda outros fatores para o fechamento das agências. “No caso dos bancos públicos, isso faz parte de uma estratégia de desmonte das empresas, com redução da capacidade de atendimento e diminuição da sua atuação, sobretudo em cidades do interior. No caso dos bancos privados, trata-se de uma concentração ainda maior da atuação dessas empresas nas grandes cidades ou cidades de médio porte”, coloca.

“Além disso, nos últimos anos, houve uma incorporação e fusão de várias empresas do setor. O Bradesco, por exemplo, adquiriu o HSBC e foi adquirindo outros bancos, como o Econômico e o Baneb. Com isso, acaba havendo uma concentração de poucas empresas que dominam boa parte do sistema financeiro. Essa concentração é ruim para o mercado e para o consumidor”, destaca Vasconcelos.

Após seis anos de queda, cresce o número de roubos a bancos na Bahia
Além do avanço da tecnologia e da necessidade dos bancos de enxugar as folhas de pagamento, outro elemento determinante é a violência. Os casos de ataque a banco vêm crescendo, levando muitas agências a decidir fechar as portas. Apesar da redução dos roubos contra bancos por seis anos consecutivos, de 2015 a 2020, a Bahia voltou a apresentar aumento desse tipo de crime em 2021. Do ano passado para cá, os números subiram em 36,3%, se considerado o período entre janeiro e julho. Foram 21 roubos em 2020 e 34 em 2021, sendo 19 no interior, 10 na capital e 5 na Região Metropolitana de Salvador (RMS), segundo dados da Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP). 

Segundo o diretor do Departamento de Repressão e Combate ao Crime Organizado (Draco), delegado José Bezerra, mais da metade das ocorrências deste ano foram registradas entre abril e maio e o aumento está ligado à pandemia.

“Diversos criminosos ganharam prisão domiciliar ou liberdade temporária. Além disso, muitos ataques aconteciam em agências da Caixa Econômica, na época em que o auxílio emergencial saía, então acreditamos que, no imaginário dos criminosos, o banco teria uma maior quantia em espécie por conta desse benefício”, explica. 

Outro fator seria a diminuição da venda de drogas no período da pandemia e, ao mesmo tempo, aumento das apreensões dessas substâncias e também de armamentos. “As quadrilhas acabaram sendo forçadas a buscar a capitalização para cobrir os ‘prejuízos’. Uma das saídas encontradas foram os ataques a banco. E vale destacar que a maioria das ocorrências não foram bem sucedidas, o que pode ter provocado uma repetição do ato criminoso em outra agência”, acrescenta.

De acordo com o delegado, a média de roubos em 2021 deve diminuir até o final do ano por conta da desarticulação das quadrilhas. “A partir da operação Aerarium, desde abril, foram 44 mandados de busca e apreensão cumpridos, 33 indivíduos identificados, 22 presos e 11 mortos em confronto, além de 39 armas de fogo apreendidas, material explosivo, drogas e mais de 350 mil reais em espécie”, afirma o delegado. A operação foi realizada em conjunto pela Polícia Civil, Polícia Militar, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e o Departamento de Polícia Técnica.

Ainda segundo o delegado, os autores de todos os ataques a bancos cometidos em 2021 já foram identificados e a operação continua até a captura de 100% dos indivíduos envolvidos. A polícia incentiva que a população contribua com denúncias e informações através do telefone 181. A denúncia é anônima. 

O que dizem os bancos
Procurado pelo CORREIO, o Banco do Nordeste afirmou que não apresentou número significativo de fechamentos e que “a quantidade atual de agências atende às necessidades negociais da instituição”. O Bradesco disse que passou por uma etapa de transformação e modernização da rede física com o crescimento da demanda dos clientes pelo atendimento digital, self service ou à distância. O banco informou ainda que algumas agências sofreram redução de tamanho físico e que, em situações específicas, houve processo de fusão de unidades sobrepostas.

O Banco Santander afirmou que está em um momento de “forte expansão na Bahia”. Segundo a assessoria, de 2018 até o final deste ano o crescimento esperado do número de agências na Bahia é de 75%. O banco acrescentou ainda que tem 72 agências na Bahia e que, até o final do ano, deve inaugurar mais 7, localizadas nos municípios de Dias Dávila, Conceição do Coite, Campo Formoso, Santo Amaro, Jaguacuara, Jaguarari, e Candeias.

A Caixa Econômica Federal afirmou que duas agências da Bahia (de Camacan e Amélia Rodrigues) estão em processo de reforma para posterior reabertura aos clientes, após ocorrências de eventos criminosos. “A Caixa esclarece que realiza a recuperação das unidades afetadas e que nenhuma unidade foi fechada definitivamente”. A nota diz ainda que o banco vai abrir, na Bahia, 7 novas agências nas cidades de Feira de Santana, Porto Seguro, Sento Sé, Mutuípe, Barreiras, Itamaraju e Vitória da Conquista. 

O banco Itaú disse que, “apesar da procura cada vez maior pelos canais digitais, a rede de agências físicas do Itaú segue cumprindo papel relevante no atendimento aos clientes, como espaços mais humanizados de relacionamento e consultoria”. A nota diz ainda que “dessa forma, o Itaú mantém uma combinação de atributos físicos e digitais que poucas instituições financeiras oferecem, respeitando preferências distintas das pessoas que se relacionam conosco”.

O Banco do Brasil afirmou que mantém presença física em todo o país com mais de 50 mil pontos de atendimento, seja através de suas agências e postos de atendimento, através  dos correspondentes identificados pela marca “Mais BB”, ou com a rede de Terminais do Banco 24 horas, como alternativa aos clientes que optam pelo atendimento presencial. A assessoria acrescenta que “além da contínua mudança do perfil e do comportamento do consumidor observada há anos, o crescimento das ações de combate à covid-19, desde o início de 2020, também impulsionou o uso de soluções e canais digitais, acelerando de forma exponencial a quantidade de adeptos às soluções de atendimento remoto”, diz a nota. 

Número de correspondentes bancários na Bahia (Fonte: Banco Central)

  • 2016: 15.998 correspondentes / 15.646 – sem lotéricas
  • 2017: 15.941 correspondentes / 15.586 – sem lotéricas
  • 2018: 17.066 correspondentes / 16.725 – sem lotéricas
  • 2019: 18.660 correspondentes / 18.310 – sem lotéricas
  • 2020: 19.842 correspondentes / 19.493 – sem lotéricas
  • 2021: 22.282 correspondentes / 21.946 – sem lotéricas

Número de municípios sem agências bancárias na Bahia: (Fonte: Banco Central do Brasil com elaboração do Sindicato dos Bancários da Bahia)

  • 2017 – 148 municípios (35,5%)
  • 2018 – 149 municípios (35,7%)
  • 2019 – 164 municípios (39,3%)
  • 2020 – 173 municípios (41,5%)
  • 2021 – 183 municípios (43,9%)

Número de agências bancárias na Bahia: (Fonte: Banco Central do Brasil com elaboração do Sindicato dos Bancários da Bahia)

  • 2018 – 1.030 agências (288 Banco do Brasil, 215 Caixa, 299 Bradesco, 94 Itaú, 53 Santander, 61 Nordeste, 20 Outros)
  • 2019 – 931 agências (261 Banco do Brasil, 214 Caixa, 288 Bradesco, 86 Itaú, 55 Santander, 59 Nordeste, 18 Outros)
  • 2020 – 926 agências (260 Banco do Brasil, 213 Caixa, 242 Bradesco, 79 Itaú, 56 Santander, 59 Nordeste, 17 Outros)
  • 2021 – 873 agências (230 Banco do Brasil, 213 Caixa, 231 Bradesco, 79 Itaú, 44 Santander, 59 Nordeste, 17 Outros)

Fonte: Correio.

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